segunda-feira, junho 01, 2015

Os acessórios para a construção do eu na dança

Olá, seres dançantes! Antes de iniciar o texto, queria lembrar que não existe verdade absoluta sobre nada, o que motiva a nunca parar de pesquisar e a sempre sermos humildes em relação ao conhecimento do outro (eu saber algo é diferente de eu achar que sei algo, tal como querer dar opinião naquilo que não domino).

Sem mais delongas, vamos ao que interessa!

Há muito que a linguagem indumentária ornamental e gráfica como base na construção das identidades étnicas é estudada pela Antropologia. Basicamente podemos dizer que para que o outro identifique quem somos antes de ter contato conosco, precisamos dar algumas pistas visuais para ele: Pintura facial, corte de cabelo, tatuagem, estilo de vestimenta, adornos, dentre outras coisas. Cada detalhe desses, por mais subjetivo que seja - na maioria dos casos é inconsciente, principalmente se tratando de coisas que incorporamos ao nosso visual sem questionar, ou seja, coisas que naturalizamos - sempre diz algo sobre quem o porta. Nossos corpos, enquanto suportes físicos para expressões e auto-representações, reproduzem as características da história pessoal e do contexto em que estamos inseridos. Em alguns grupos, é muito clara esta relação de comunicação entre os aspectos ornamentais e gráficos da construção da imagem pessoal com os aspectos ritualísticos, cosmológicos, religiosos, econômicos e patrimoniais do universo em que eles estão inseridos.


E o que isso tem a ver com a dança?
(vou trabalhar aqui de forma bastaaante generalizada, ok?)

Dentro da sociedade ocidental moderna, puberdade é a fase que marca o translado de sujeito para pessoa (indivíduo provido de status social). Passamos de seres dependentes emocionalmente da figura dos pais ou responsáveis para pessoas que gritam por um espaço seu no mundo. Por isso geralmente essa fase esta atrelada a uma explosão na cabeça das crianças (e olhem bem, não estou nem falando da questão hormonal). Um dia estamos brincando de pular corda e no outro estamos questionando a utilidade daquilo que o professor ensina na sala de aula. Mas um outro detalhe marca essa fase: Começamos a copiar o que os outros vestem de forma a sermos aceitos naquele meio. Ora, não estou falando do menino que quer o relógio do Ben 10 porque todos os coleguinhas o tem, e sim do começo da construção do eu, da escolha do tipo de acessório, corte de cabelo e cor de roupa para ser visto como integrante de determinado grupo suburbano ou outro.

Quer exemplo mais didático que As Patricinhas de Beverly Hills? haha

Agora que é entra o uso dos acessórios na Fusão Tribal. Conheço vários casos de pessoas que se "fantasiam" de Fusão Tribal sem, de fato, dançar Fusão Tribal (não estou julgando ninguém, ok? estou apenas usando como objeto de estudo para desenvolver a ideia do texto). Evidente que a imagem impacta e apaixona à primeira vista. Mas o que faz algumas pessoas se preocuparem mais em adquirir acessórios e fazer tatuagens do que dominar o básico da técnica ou gastar este dinheiro em workshops? Há uma clara influência capitalista acumulativa por trás disso, mas vamos deixar este ponto para um outro texto. Num meio onde se encontram várias bailarinas de Fusão Tribal, a melhor forma de falar que tu também está inserida neste meio, quando não estás dançando, é dando pistas visuais (lembra que falei disso há três parágrafos?). Há ainda a euforia de conhecer este novo mundo e querer pertencer a ele, por isso, mais uma vez a importância que algumas pessoas podem dar para o uso dos ornamentos (lembram da puberdade, ali no parágrafo de cima?).

Por fim, queria destacar o impacto do uso dessa indumentária ornamental e gráfica para o público leigo. Não podemos negar que durante os festivais de dança os figurinos ganham um destaque a parte, seja com comentários de bailarinas na platéia, inúmeros estandes de venda em algum hall de festival, critério específico de avaliação por parte dos jurados e brilho nos olhos do público que pouco conhece as técnicas da dança. Isso leva a julgamentos tendenciosos daqueles que estão assistindo para com aqueles que se apresentam. Quantas vezes já ouvimos comentários de que uma coreografia era fantástica quando, na verdade, estavam se referindo ao figurino? Ou mesmo que determinada coreografia era sem graça quando, na verdade, não curtiram o figurino? Daí a necessidade da pessoa de mostrar que pertence a uma categoria de dança.


Deixo aqui a minha opinião pessoal de que o critério de análise de muitos concursos de dança de criar uma categoria "Melhor Figurino" ou mesmo dentro da listagem de análises individuais sempre aparecer a maldita categoria "Figurino", não só é algo extremamente limitador, como também corrobora com a supervalorização dos figurinos, fazendo com que as bailarinas gastem verdadeiras fortunas (ou percam valiosas horas costurando e bordando) apenas para receber um "ok" dos jurados e do público. Mais que isso, faço um apelo sobre a necessidade de não pertencer a Fusão Tribal, ou Folclore Árabe, Dança do Ventre Moderna, Clássica, Vintage, ATS, dentre outras categorias quaisquer. Lembram da discussão sobre a dança democrática, que aceita todos os corpos? A dança também aceita todos os estilos. Não se adequem visualmente a ela, façam ela se adequar a vocês!

by Letícia Maciel

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